sexta-feira, 5 de julho de 2013

Operação João de Barro da Polícia Federal

A Polícia Federal realiza nesta sexta-feira uma grande operação em Minas Gerais e outros sete estados para combater fraudes em concessões de verbas do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). Os agentes cumprem 38 mandados de prisão e 231 mandados de busca e apreensão. Segundo os levantamentos, os projetos envolvidos no esquema já receberam R$ 700 milhões em verbas públicas, mas também são investigados outros contratos que somam R$ 2 bilhões.

A operação ocorre simultaneamente em Minas, São Paulo, Rio de Janeiro, Espírito Santo, Rio Grande do Norte, Goiás, Tocantins e no Distrito Federal. Uma auditoria do Tribunal de Contas da União (TCU) realizada em 29 municípios do leste de Minas revelou indícios de fraude na execução de obras. Os policiais buscam documentos que ajudem a comprovar o desvio de dinheiro público na utilização de verbas federais para compra de material de construção.
 
Tarso descarta vínculo político na Operação João de Barro
 
O ministro Tarso Genro (Justiça) negou nesta sexta-feira que a Operação João de Barro, deflagrada pela Polícia Federal, tenha objetivos políticos às vésperas das eleições municipais, ou mesmo tenha sido tomada de forma "arbitrária" pela própria PF. Tarso disse que as operações da Polícia Federal em 119 prefeituras brasileiras são conseqüência de ações do TCU (Tribunal de Contas da União) em Minas Gerais e da CGU (Controladoria Geral da União).

"Todas as buscas, mandados de prisão e investigação, não têm destinação voltada a qualquer região, facção política ou ideológica. Obedece estritamente o trabalho dos órgãos técnicos do governo. Essas operações são normais, vão continuar e queremos que sejam ancoradas no sucesso do ponto de vista técnico, jurídico e de proteção da intimidade das pessoas", afirmou.

A operação cumpre 231 mandados de busca e apreensão e 38 de prisão temporária em sete Estados. O desfalque atingia as chamadas Transferências Voluntárias, que compreendem recursos financeiros repassados pela União aos Estados, Distrito Federal e municípios em decorrência da celebração de convênios ou empréstimos cedidos pela Caixa Econômica Federal e BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social). De acordo com a polícia, parte dessas transferências se destinam a custear obras do PAC (Programa de Aceleração do Crescimento).

Ao descartar qualquer vínculo político na operação, Tarso disse que os inquéritos da Operação João de Barro foram baseados em aspectos técnicos das investigações. "Estes inquéritos têm fundamento técnico nos próprios órgãos de controle da União Federal. Nada tem a ver com decisão arbitrária da PF ou muito menos do Ministério da Justiça a respeito da busca de responsáveis por determinados atos ilícitos que aparecem nesses inquéritos.

O ministro afirmou que, no total, 1.000 policiais federais foram deslocados para a Operação João de Barro, que investigou 119 prefeituras do país. Tarso disse que a PF também deflagrou nesta sexta-feira outras duas operações, em Santa Catarina, São Paulo e Mato Grosso para o combate à lavagem de dinheiro e narcotráfico.

São operações realizadas de maneira transversal na máquina pública, com articulação permanente do Ministério da Justiça e o Ministério Público Federal", justificou.

O ministro afirmou que, na Operação João de Barro, a Polícia Federal cumpriu a determinação do novo diretor-geral da instituição, Luiz Fernando Corrêa, de não expor os presos ou investigados pela PF. "Conseguimos aplicar de maneira integral o manual da PF com os indicativos de não expor as pessoas que estão sendo pressas, ou fazê-lo o mínimo possível, para que não funcione como punição antecipada", explicou.

Câmara Tarso disse que os mandados de busca e apreensão de documentos nos gabinetes dos deputados João Magalhães (PMDB-MG) e Ademir Camilo (PDT-MG) foram autorizados tanto pela Justiça quanto presidente da Câmara, Arlindo Chinaglia (PT-SP). "O Congresso não é foco, a operação foi realizada por determinação da Procuradoria Geral da República e do Ministério Público Federal. Foi feita a operação a partir de relação direta dele com o presidente Chinaglia, que determinou a operação dentro da Câmara, em dois gabinetes." Tarso disse que também comunicou o ministro Márcio Fortes (Cidades) de que a PF realizaria busca e apreensão de documentos na sede do ministério.

Segundo o ministro, o grande efetivo de policiais envolvidos na operação foi conseqüência dos mandados de prisão, busca e apreensão expedidos pela Justiça. "A mobilização dos agentes se dá de acordo com o número de mandatos expedidos, nada tem a ver com a natureza das obras [do PAC]." O ministro negou que o foco no PAC tenha qualquer relação com a celeridade concedida pelo governo ao programa. Tarso saiu em defesa das obras do programa ao afirmar que as irregularidades podem ser registradas em qualquer ação executada pelo Poder Executivo.

"Não tem a ver com a celeridade prestada pelo governo [ao PAC]. Mas sim ao órgãos originários da execução. Acho que [o governo] tem que apressar as obras de contratação dentro de toda legalidade e cautela. As distorções locais ocorrem em qualquer tipo de outra. O que existe hoje no país é sem trégua contra a corrupção no país. Isso é característica que não vai ser mudada independentemente da obra."
PF vasculha prefeituras mineiras
 
Prefeituras de grandes cidades mineiras são alvo da Operação João de Barro, realizada nesta sexta-feira pela Polícia Federal. Em Contagem, na Região Metropolitana de Belo Horizonte, os agentes deixaram a sede da administração municipal com caixas repletas de documentos. Segundo o comando da operação, há indícios de fraudes em concessões de verbas do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC).

A prefeitura de Contagem divulgou nota dizendo que vai colaborar com a investigação, mas a prefeita Marília Campos (PT) não quis responder às perguntas da imprensa. Todo o material recolhido foi encaminhado à Superintendência da Polícia Federal em Belo Horizonte.

Mais quatro cidades do Norte de Minas também receberam diligências da Polícia Federal: Pirapora, Buritizeiro, Jaíba e São Francisco.

A Prefeitura de Montes Claros, por meio de nota, diz que toda a documentação relacionada à aplicação de recursos públicos está à disposição da Polícia Federal para ser analisada. A administração determinou “aos técnicos colaboração irrestrita com as incursões e informações necessárias para auxiliar na investigação”, diz o informe.

Sobre os recursos do PAC, a prefeitura garante que os mesmos não foram executados, uma vez que as licitações estão em andamento. O chefe do Executivo municipal, Athos Avelino, entende “que todas as ações que visem fiscalizar a aplicação de recursos públicos são bem-vindas e devem ser incentivadas por todos os gestores”, finaliza o texto.

Em Betim, quatro agentes da PF estiveram na prefeitura e recolheram documentos que serão investigados posteriormente. A Procuradoria Geral do Município e a Secretaria Adjunta de Administração informam que duas obras na cidade têm recursos vinculados ao PAC. Mesmo assim, os projetos estão parados porque não houve liberação de recursos.
 
Veja a lista de cidades investigadas

Minas Gerais

1. Água Boa

2. Almenara

3. Alpergata

4. Alto Jequitibá

5. Alvarenga

6. Araguari

7. Barbacena

8. Betim

9. Boa esperança

10. Bom jardim de minas

11. Buritis

12. Buritizeiro

13. Campanário

14. Capitão Andrade

15. Caputira

16. Carandaí

17. Claraval

18. Comercinho

19. Conselheiro Pena

20. Contagem

21. Coroaci

22. Córrego Fundo

23. Crisólita

24. Divino das Laranjeiras

25. Divinópolis

26. Dom Joaquim

27. Engenheiro Caldas

28. Entre Folhas

29. Formiga

30. Fortuna de minas

31. Francisco Dumont

32. Frei Inocêncio

33. Galiléia

34. Goiabeira

35. Gonzaga

36. Governador Valadares

37. Ibirité

38. Iguatama

39. Ipanema

40. Ipatinga

41. Itabira

42. Itabirito

43. Itaúna

44. Jaboticatubas

45. Jacinto

46. Jaíba

47. Jambruca

48. Japaraíba

49. Juatuba

50. Juiz de Fora

51. Lagoa da Prata

52. Lagoa Santa

53. Mamonas

54. Mantena

55. Marila

56. Mario Campos

57. Martins Soares

58. Materlândia

59. Monte Azul

60. Montes Claros

61. Nova Lima

62. Nova Módica

63. Oliveira

64. Papagaios

65. Passa-Tempo

66. Passos

67. Paulistas

68. Peçanha

69. Pedro Leopoldo

70. Pequi

71. Perdigão

72. Pirapora

73. Pium

74. Poços de Caldas

75. Pocrante

76. Raul Soares

77. Riachinho

78. Ribeirão das Neves

79. Rubim

80. Sabará

81. Sabinópolis

82. Santa Efigênia de Minas

83. Santa Luzia

84. Santa Rita do Itueto

85. Santa Vitória

86. Santana do Paraíso

87. Santana do Riacho

88. São Domingos do Prata

89. São Félix de Minas

90. São Francisco

91. São Geraldo do Baixio

92. São Gonçalo do Pará

93. São João del Rei

94. São João do Oriente

95. São José da Varginha

96. São José do Jacuri

97. São Lourenço

98. São Pedro do Suaçuí

99. São Sebastião do Maranhão

100. Sardoá

101. Senhora do Porto

102. Sete Lagoas

103. Tarumirim

104. Teófilo Otoni

105. Três Marias

106. Três Pontas

107. Tumiritinga

108. Ubá

109. Uberlândia

110. Unaí

111. Vargem Alegre

112. Vespasiano

113. Virginópolis

114. Virgolândia

Rio de Janeiro

Angra dos Reis

Belford Roxo

Cabo Frio

Tocantins

Palmas

Espírito Santo

Cachoeiro de Itapemirim


PF deixa os gabinetes dos deputados Ademir Camilo Prates e João Magalhães

As fraudes estão ligadas, principalmente, à construção de casas populares e estações de tratamento de esgoto em vários municípios. O desfalque atingia as chamadas Transferências Voluntárias, recursos financeiros repassados pela União aos estados, Distrito Federal e municípios em decorrência de convênios ou empréstimos cedidos pela Caixa Econômica Federal e BNDES.

Com menos dinheiro para a execução, as obras não apresentaram o padrão de qualidade e quantidade previsto no projeto original, como emprego de material de qualidade inferior, extensão da obra entregue menor que a estabelecida no projeto ou não realização da obra.

Os agentes fazem buscas em importantes cidades mineiras: Contagem, Ribeirão das Neves, Vespasiano, Itabira , Sabará, Nova Lima, Pedro Leopoldo, Montes Claros, Governador Valadares, Juiz de Fora, Divinópolis, Teófilo Otoni, Oliveira e Formiga. A polícia ainda não divulgou detalhes da operação, mas há suspeita do envolvimento de políticos e funcionários públicos no esquema de fraudes.

Ao contrário do anteriormente informado, a cidade de Varginha não está na lista das prefeituras em que a Polícia Federal realiza buscas nesta sexta-feira.
 
 

O novo operador do orçamento

O secretário nacional do PT, Romênio Pereira, é acusado de participar de quadrilha que desviou mais de R$ 700 milhões dos cofres públicos


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Em abril passado, Romênio Pereira, secretário nacional do PT, articulou uma reunião de mais de 300 prefeitos do partido com os ministros Dilma Rousseff, da Casa Civil, e Paulo Bernardo, do Planejamento. No Hotel Nacional, em Brasília, eles foram informados sobre a melhor maneira de obter recursos do Programa de Aceleração do Crescimento, o PAC, para seus municípios. Até a semana passada, deveria caber a ele repetir a cena quando a eleição deste ano chegasse ao fim. Mas antes mesmo que o PT possa contar o número de novos prefeitos, Romênio Pereira vai ter de responder por uma encrenca das grossas.
 
No próximo mês, o procurador-geral da República, Antônio Fernando de Souza, apresentará ao Supremo Tribunal Federal (STF) o resultado de uma investigação que atinge diretamente o secretário nacional do PT e vários deputados. Trata-se do resultado da petição 3683, que tem como apenso a petição avulsa 53976, que investiga a ação criminosa de deputados federais, lobistas, funcionários públicos e prefeitos que se locupletavam comercializando emendas parlamentares ao Orçamento da União. Segundo o Ministério Público, essa quadrilha teria desviado mais de R$ 700 milhões. É uma espécie de nova máfia do Orçamento, à semelhança do caso que há 15 anos resultou em acusações contra 15 parlamentares. Desses, seis foram cassados e quatro renunciaram. Detalhe: na antiga denúncia, apontou- se um desvio de R$ 101 milhões.
 
Com mais de dez mil páginas, 20 volumes, 80 gigas de memória em arquivos, o inquérito revela a radiografia de um sofisticado esquema criminoso que envolve 23 construtoras e 119 prefeituras espalhadas pelos Estados do Espírito Santo, Minas Gerais, Rio de Janeiro, São Paulo e Tocantins. Nas investigações, ficou comprovado que a quadrilha desviou verbas do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) e montou uma rede de informações privilegiadas, com participação de funcionários do Ministério das Cidades, Integração Nacional, Saúde e até do Tesouro Nacional.
A denúncia, que tramita em segredo de Justiça, é demolidora: "A execução do esquema delituoso passou a ser feita por grupos organizados nos moldes de verdadeiras organizações criminosas (...), unidos para a consecução do objetivo comum de promover o desvio de recursos públicos federais destinados aos municípios para o financiamento de obras públicas". A quadrilha, ainda segundo o inquérito, agia sob as ordens do lobista João Carlos de Carvalho, um empresário mineiro que ficou milionário com o esquema que funcionava há pelo menos sete anos na Esplanada dos Ministérios. No Congresso, seu principal elo era o deputado João Magalhães (PMDB-MG). No documento, obtido com exclusividade por ISTOÉ, aparecem os nomes de sete parlamentares. Além deles, o procurador também aponta o dedo para Romênio Pereira, como o suposto elo entre lobistas, prefeituras e o governo.
 
A escalada de Romênio Pereira no PT sempre deixou intrigada uma boa parte dos dirigentes históricos do partido. Afinal, ele nunca foi nenhum ideólogo, não teve participação nos movimentos sociais e muito menos militou na área sindical. Apesar dessa carência de credenciais, Romênio é um dos 12 integrantes da cúpula nacional. Era vice-presidente do partido até o ano passado. Se não tivesse havido intervenção no partido após a renúncia de José Genoino, durante a crise do Mensalão, há três anos, ele teria se tornado presidente do PT. Agora, como um dos nove secretários nacionais, tem a missão de facilitar o trânsito dos prefeitos do partido com os diversos ministérios, em busca de projetos e programas que melhorem a vida nos municípios. "O secretário de Relações Institucionais cuida da relação do partido com os prefeitos", diz Romênio. "Eu sou chamado no PT de Rei dos Grotões", emenda.
 
Ao monitorar João Carlos de Carvalho, a PF descobriu que ele conversava seguidamente com Romênio. Entre os dias 13 de junho e 19 de novembro de 2007, período do monitoramento, foram sete encontros. "Primeiro, os encontros são sempre regulares, com espaço médio de 20 dias entre eles; segundo, sempre acontecem em locais seguros, na casa de João Carlos ou no gabinete de Romênio; terceiro, nunca é tratado no telefone o motivo desses encontros, o que indica a adoção de cautelas contra eventual escuta telefônica; quarto, há sempre referência nas conversas a "aquele amigo" ou "aquele meu amigo", a "acerto", técnicas de diá-logo utilizadas por quem quer ocultar eventual ilicitude dos seus atos", diz o documento do Ministério Público Federal. Procurado por ISTOÉ, Romênio diz nada saber sobre as referências a "um amigo", "aquele meu amigo" ou "acerto", captadas nas escutas telefônicas.
 
"A suspeita é de que ele atue politicamente para viabilizar, perante os ministérios e outros órgãos do governo federal, a rápida destinação dos recursos aos municípios e a celebração dos convênios", escreve o procurador-geral, na página 13 do documento. "Não fiz pedido a nenhum ministério para atender a qualquer demanda específica do João Carlos", rebate o dirigente do PT. Noutro trecho, Antônio Fernando de Souza é ainda mais contundente. "Não há razão lícita aparente que justifique os 'negócios' entre os dois interlocutores. João Carlos atua na área de construção civil, comandando um suposto esquema de fraudes em licitações com desvio de recursos públicos federais, enquanto Romênio é um articulador político do Partido dos Trabalhadores", escreveu o procurador, que continua: "Uma investigação mais apurada desse suspeito relacionamento entre o lobista João Carlos de Carvalho e o secretário nacional de Assuntos Institucionais do Partido dos Trabalhadores Romênio Pereira permitirá esclarecer as razões dos freqüentes encontros e se de fato Romênio Pereira seria a pessoa que proporciona a João Carlos os contatos necessários para viabilizar as fraudes investigadas." João Carlos não foi encontrado pela reportagem para comentar a denúncia.
 
Dentro da burocracia partidária, Romênio chama a atenção por uma característica peculiar: ele não usa computador e só escreve a lápis. Assim como o ex-tesoureiro Delúbio Soares e o exsecretário- geral Sílvio Pereira, defenestrados do partido depois do escândalo do Mensalão, Romênio construiu sua carreira partidária à sombra do poder. Mineiro de Patos de Minas, ele é irmão do deputado federal Geraldo Magela (PT-DF). Pragmático, o secretário nacional se declara um dos petistas mais abertos a ampliar alianças. Na cúpula, foi o único que apoiou abertamente a união do PT com o PSDB mineiro em apoio ao candidato do PSB, Márcio Lacerda, à Prefeitura de Belo Horizonte.
 
A ISTOÉ, Romênio não negou a relação com o lobista João Carlos de Carvalho
 
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"Eu só não sabia que ele era lobista." Romênio diz que conhece Carvalho há cinco anos. Foi apresentado a ele no aeroporto de Belo Horizonte, antes de um vôo para Brasília, pelo ex-prefeito de Governador Valadares João Fassarella, morto em 2006. "Ele nos viu conversando e se aproximou. A partir daí, começou a procurar ter encontros comigo", diz. Segundo Romênio, depois do terceiro encontro, ele perguntou o que, afinal, Carvalho queria com ele. "Sou um pequeno empresário na área de projetos. Quero que você me apresente a prefeitos", disse o lobista, de acordo com o relato de Romênio. Nesse caso, Carvalho tinha ido ao endereço certo. "Mas eu não me lembro de ter indicado qualquer prefeitura para favorecer o João Carlos", defende-se Romênio.
 
Como, então, explicar tantos encontros, até com o convite, aceito, para que Romênio almoçasse em Belo Horizonte na casa de Carvalho, num apartamento avaliado em quase R$ 2 milhões? "Ele parecia um homem simples, simpático. Estabeleceu- se uma boa relação, uma relação de um quadro político com um pequeno empresário", diz Romênio. De qualquer modo, numa das conversas grampeadas, Carvalho reclama que o diretor de produção habitacional do Ministério das Cidades, Daniel Vidal Nolasco, "não está ajudando nada". Romênio dá uma explicação: "Ele, de fato, uma vez me perguntou se eu conhecia alguém no Ministério, eu conhecia o Daniel". Em outra conversa captada, a PF diz que Romênio disse a Carvalho que Nolasco queria falar com ele. "Não me lembro disso", defende-se Romênio. "De tudo, porém, estou seguro de que não há nada que me comprometa com esse rapaz", diz o dirigente, referindo- se a Carvalho.
 
A etapa inicial da investigação sobre esse novo escândalo do Orçamento resultou na Operação João-de-Barro, que promoveu a prisão de prefeitos, empreiteiros e lobistas de Minas Gerais e apontou o envolvimento direto dos deputados mineiros João Magalhães (PMDB) e Ademir Camilo (PDT). Ambos estão sendo investigados pela Corregedoria da Câmara dos Deputados, em processos que podem resultar na cassação dos seus mandatos. As prisões e outras providências pedidas no dia 11 de junho pelo procurador- geral da República, Antônio Fernando de Souza, ampliaram as informações obtidas pela Polícia Federal. O que vai surgir agora concentra- se principalmente nas investigações que resultaram dos "Autos Apartados em Petição 3683", em que Antônio Fernando de Souza encaminha ao Supremo detalhes das investigações que estão em curso. O relatório identifica o nome de outros três parlamentares mineiros, além de Magalhães e Camilo, que apareceram nas escutas telefônicas: José Santana de Vasconcelos Moreira (PR), Jaime Martins Filho (PR) e José Miguel Martini (PHS). E menciona outros dois, também de Minas, cujas emendas orçamentárias teriam sido usadas pelo esquema: Leonardo Monteiro (PT) e Carlos William (PTC).
 
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Segundo a denúncia do procuradorgeral da República, o esquema funcionava da seguinte forma: primeiro, o deputado indicava os municípios e os valores para a liberação de verbas, utilizando emendas do Orçamento de sua autoria ou de terceiros. Feito isso, a quadrilha passava para a segunda etapa do crime, que é a assinatura dos convênios. Nesse momento, a elaboração dos projetos ficava a cargo do lobista, que também se encarregava de acompanhar sua aprovação. Quando o empenho (a garantia da futura liberação do dinheiro) era assinado, o prefeito pagava um percentual (entre 10% e 12%) para Carvalho. Caso se recusasse a pagar, Carvalho tinha o poder de conseguir o direcionamento da verba para um outro município.
 
Um caso emblemático é narrado nos documentos obtidos por ISTOÉ. Em um deles, o prefeito petista da cidade mineira de São Félix de Minas, Wanderley Vieira de Souza, conversa com a assessora de Magalhães, Mary Lanes, sobre como deveria fazer para pagar a propina. A assessora oferece a sua própria conta bancária para que o prefeito faça o depósito:
 
- Deixa eu te falar, você não me ajeita uma conta para fazer a transferência daquele dinheiro, não? - pergunta o prefeito.
- Transfere para a minha conta, então - sugere Mary Lanes.
Numa conversa posterior, Mary Lanes indica a Wanderley uma conta num banco.
- Beleza! Vem cá, eu coloco é 39 ou 40 mil? - pergunta o prefeito.
- Quarenta. Fechado - responde Mary.
- Então, é 11%, né, danada? - completa Wanderley.
 
No depoimento que prestou à comissão de sindicância criada pelo corregedor- geral da Câmara, Inocêncio Oliveira (PMDB-PE), para investigar seu caso, o deputado Magalhães indicou que novos nomes apareceriam na investigação da complexa trama que o esquema de desvio de verbas criou. "Ele, que teve acesso a todo o processo, nos disse que há vários envolvidos e que a conclusão da investigação iria demorar", disse à ISTOÉ um dos assessores da comissão de sindicância. Encontrar os demais envolvidos e as suas conexões é a tarefa em que se debruçam agora a PF e o Ministério Público Federal. No caso específico de Romênio, para tanto, o ministro do STF, Cezar Peluso, responsável pelo inquérito no Supremo, autorizou as quebras dos seus sigilos telefônico, bancário e fiscal, já que "foram, ademais, captados, nas interceptações, diálogos que comprovariam o envolvimento, no esquema, de Romênio, sob a suspeita de que atuaria politicamente para viabilizar, perante os Ministérios e outros órgãos federais, a rápida assinatura de convênios e a destinação dos recursos aos municípios...". Procurado por ISTOÉ, o deputado Magalhães disse que estava impedido por seus advogados de falar. "Eu só posso dizer que não tenho nada com isso e vou mostrar que sou inocente", disse.
 
DEPUTADO ACUSADO DE ROUBAR DEPUTADO
Os novos anões do Orçamento não perdoam nem os colegas
Vem de um procurador ouvido por ISTOÉ a mais curiosa revelação do esquema dos novos "Anões do Orçamento". "Apuramos que um deputado roubou dinheiro de outro deputado", revela ele, que participou das investigações. Essa ação inusitada foi possível porque o esquema mantinha um monitoramento constante da execução orçamentária. Assim, sabia qual deputado solicitara verba para tal cidade. A rede montada pelo esquema agia, então, para acelerar a liberação, e acertava o convênio com o prefeito, muitas vezes sem que o deputado autor da emenda soubesse o que estava acontecendo. Na página 29, do volume 14, a transcrição de um grampo telefônico deixa clara essa estratégia. Tratase de uma conversa, no dia 14 de julho de 2007, entre o deputado João Magalhães e sua assessora Mary Lanes: "A gente belisca nas outras... Aqui, o negócio do Leonardo é só nós dois, ninguém sabe não, tá? O negócio do Leonardo, os 10% dele é meu e seu, ninguém sabe disso não", diz Magalhães.

Segundo um dos procuradores que trabalham na investigação, Leonardo no caso é o deputado federal Leonardo Monteiro, do PT. "Eu não sei se o Leonardo que o João Magalhães cita sou eu mesmo, mas isso tudo aí é muito estranho", defende-se Leonardo. "Se isso aconteceu de fato, então eu sou vítima." O deputado José Miguel Martini (PHS), também citado no relatório, é mais incisivo. "Eu fui usado por esse esquema", reclama. No caso, João Carlos de Carvalho telefonou para o gabinete de Martini na Câmara e converconversou com um assessor do deputado, Cláudio de Faria Maciel. Depois de um entendimento prévio, Carvalho indicou ao assessor que apresentasse uma emenda ao Ministério das Cidades, para calçamento de ruas, no município mineiro de Dom Joaquim.
 
"Esse sujeito procurou o gabinete dizendo que tinha espaço político e poderia ajudar a liberar emendas. Eu não o conhecia. Então, para iniciar uma relação, eu orientei meu assessor a indicar uma emenda de valor baixo, apenas para ver o que acontecia", explica Martini. "Eu pessoalmente não falei com ele, não conheço o sujeito, não sabia que era lobista. A gente recebe ligação de um monte de gente sem saber quem é. Eu não tenho bola de cristal", defende-se. Martini afirma que, depois que Carvalho foi preso na Operação João-de-Barro, ele solicitou aos Ministérios que cancelassem todas as suas emendas orçamentárias.
 
A Polícia Federal suspeitava que a emenda de outro deputado também tivesse sido usada da mesma forma pelo esquema. No caso, o deputado Carlos William. Mas ele mesmo deu à ISTOÉ outra explicação. "O pessoal do meu gabinete não tem muita experiência com orçamento. Então, como eles têm amizade com o pessoal do gabinete do João Magalhães, pedem para eles acompanharem a execução das nossas emendas", disse William. Com a conclusão da PF e do Ministério Público de que Magalhães era um dos comandantes do esquema, foi como pedir à raposa que tomasse conta do galinheiro.

Fonte: Isto É Independente

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